Mesmo entidades que possuem benefícios tributários devem priorizar os controles financeiro e contábil, em especial com as obrigações acessórias, para garantir os incentivos e a confiança dos doadores.

A relação das organizações do terceiro setor com a sociedade é baseada na credibilidade. “Nós somos financiados, principalmente, por doação. E doação é confiança”, argumenta o diretor-executivo da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR), professor de responsabilidade social corporativa da Fecap e coordenador voluntário do Grupo de Excelência de Administração do Terceiro Setor, do Conselho Regional de Administração de São Paulo (Geats – CRA/SP), João Paulo Vergueiro.

“Se ocorre uma quebra de confiança, as pessoas não doam mais, os governos não nos financiam e as empresas não contribuem com os nossos projetos”, comenta. A boa gestão tributária é, portanto, fundamental para essas entidades.

Tributos e benefícios

Vergueiro explica que Organizações Não Governamentais (ONGs) ou Organizações da Sociedade Civil (OSCs) que realizam atividades comerciais e não possuem nenhum tipo de benefício fiscal ou imunidade de tributação pagam os impostos que seriam cobrados de empresas que exercem as mesmas atividades. É o caso do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU); do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), caso haja relação de compra e venda; do Imposto Sobre Serviços (ISS), quando envolve prestação de serviços; ou da cota patronal recolhida para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

“É um cenário extremamente complexo”, avalia a advogada especialista em legislação do terceiro setor e presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado de São Paulo (OAB/SP), Ana Carolina Pinheiro Carrenho. “Cada organização possui um regime tributário a ser observado, independentemente das imunidades e isenções tributárias”, frisa.

No entanto, há regras que se aplicam a todas. Uma delas é a da isenção do Imposto de Renda a todas as associações sem fins lucrativos, sejam elas do terceiro setor ou não. Por outro lado, há muito conflito em relação às leis estaduais, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) incidente sobre doações recebidas. Como o ITCMD é cobrado na esfera estadual, os percentuais aplicados não são uniformes e, além disso, algumas unidades da federação podem conceder isenções.

Organizações de saúde, assistência social e educação têm imunidade garantida pela Constituição Federal. No entanto, precisam obter o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social específico (Cebas) para cada área de atuação – Cebas Educação, Cebas Saúde e Cebas Assistência Social –, a fim de usufruir da imunidade em relação às contribuições sociais.

No âmbito da captação de recursos, existem formas de estímulo que facilitam a obtenção de recursos, como as leis de incentivo fiscal. Elas se aplicam a questões como saúde, cultura, esportes, idosos, crianças e adolescentes. Carrenho esclarece que algumas doações incentivadas estão condicionadas aos fundos de direitos e à aprovação das respectivas prestações de contas pela administração pública.

Planejamento e gestão

A isenção ou a imunidade constitucional não elimina a necessidade de cumprimento de obrigações acessórias e nem de prestação de contas. A boa contabilidade é indispensável, reforça Vergueiro. “A entidade não pode, por exemplo, perder o prazo para renovar uma certificação e essa é uma questão de acompanhamento da gestão contábil”.

Existem, ainda, outras obrigações a cumprir: havendo imunidade, é necessário renovar o Cebas. Da mesma forma, todas as organizações precisam prestar contas para a Receita Federal, recolher guias para o órgão e pagar os impostos, quando for o caso. “Esse é o mínimo a fazer para garantir os incentivos”, lembra Vergueiro.

Por todas essas exigências, Carrenho recomenda que as organizações façam o planejamento tributário e o mapa de risco tributário, cuidados que devem vir acompanhados de uma rigorosa administração dos recursos e do apoio de profissionais especializados. Vergueiro indica, ainda, os serviços de auditoria, que podem ser remunerados ou pro bono, para fortalecer a transparência e a gestão contábil.