Mudança de rotina necessária para que micro e pequenas empresas cumpram as obrigações do eSocial dentro do prazo impõe alinhamento na relação entre empresários e contadores.
Depois de diversas prorrogações, o Sistema de Escrituração Fiscal Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial) entrará definitivamente na vida das micro e pequenas empresas (MPEs) de todo o Brasil. A partir de 1º de julho, elas terão de utilizar esse módulo do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) para registrar informações sobre empregados e eventos como horas extras, férias, salários e rescisões contratuais.
Essa nova realidade, segundo a advogada trabalhista e diretora da SDS Treinamento Empresarial, Luciana Saldanha, inspira cautela aos empresários. “Apesar de a Receita Federal ter divulgado o projeto em 2011 e prorrogado sua vigência por anos, muitas empresas, principalmente as optantes pelo Simples Nacional, deixaram para última hora a revisão das obrigações acessórias decorrentes dos vínculos empregatícios. Agora, na iminência da entrada em vigor do eSocial, providências urgentes devem ser tomadas. A documentação atualizada do empregado, a qualificação cadastral e o abastecimento das informações no sistema próprio da folha de pagamento têm de ser agilizados, pois poderá haver o bloqueio da transmissão dos arquivos em caso de inconsistência”, alerta.
De acordo com Saldanha, devido ao curto lapso de tempo até sua implantação, algumas medidas de suma importância devem ser as primeiras a serem tomadas: o mapeamento dos riscos e sua correção e a atenção à legislação trabalhista no que tange ao processo de contratação, concessão de férias, procedimentos rescisórios e outros. A especialista ressalta que, apesar de o eSocial possuir várias peculiaridades quanto a prazos e formas de apresentar dados ou transmitir arquivos, a grande preocupação não é com sua operacionalização, mas com o atendimento à legislação que, muitas vezes, é ignorado pelos empregadores.
Normalmente, todas as informações referentes à mão de obra onerosa são repassadas ao setor responsável pela confecção da folha de pagamento ao final do mês. Não raro, porém, os dados pertinentes a faltas, atestados, afastamentos, horas extras, acidentes ou mesmo registros chegam atrasados para a empresa contábil. “Atualmente, o sistema pode ser corrigido sem implicações, mas após a liberação do eSocial, a transmissão do arquivo em atraso vai acarretar multas e sanções administrativas, onerando cada vez mais as empresas. Assim, é prudente alterar a cultura e a rotina das micro e pequenas empresas (MPEs), privilegiando o contato direto e imediato com a contabilidade, com o intuito de repassar todas as informações a tempo para o abastecimento dos dados junto ao sistema”, recomenda a advogada.
Na opinião do diretor de educação e cultura da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisa (Fenacon), Hélio Donin Júnior, o atendimento aos prazos para cumprimento da nova obrigação afetará a rotina das MPEs, que são as que mais sofrem com as mudanças impostas por novas obrigações. “Automatizar os processos de envio das informações para o departamento de pessoal, seja interno ou terceirizado, é a peça chave para conseguir cumprir os prazos legais relacionados à área trabalhista e ao eSocial”, afirma.
Da mesma forma, o diretor cultural do Sindicato dos Contabilistas de São Paulo (Sindcont-SP), Claudinei Tonon, aponta para a necessidade de contadores e empresários redefinirem seu relacionamento antes que a nova exigência trabalhista entre em vigor, para que nenhuma das partes seja prejudicada. “O empresário é o detentor das informações e precisa atuar alinhado ao contador, para que esses dados sejam fornecidos no prazo e com a qualidade exigida pelo sistema”, aconselha.
Nesse sentido, embora o envio de informações já em formato digital seja imprescindível para que a assessoria contábil possa atender as obrigações dentro do prazo, alguns empresários resistem à informatização de seus sistemas por achar que, assim, estariam “fazendo o trabalho do contador”. Para Tonon, a resistência à mudança cultural vai depender da forma como será implementada pela empresa de contabilidade. “A melhor forma de lidar com esta objeção é orientar o gestor sobre a complexidade do eSocial”, explica.
Procedimentos
Enfatizando que “relacionamento é primordial”, Tonon defende a importância de contadores alinharem os prazos para cada obrigação com os empresários, inclusive em relação a eventos ocorridos aos sábados, domingos e feriados, quando as assessorias contábeis não trabalham, mas alguns de seus clientes, sim. “Muitas datas foram flexibilizadas ao longo das atualizações do eSocial e o prazo mais crítico ficou para admissão, que é uma rotina previsível. Os acidentes de trabalho, por exemplo, têm como prazo o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato. Aqui estamos falando da Comunicação de Acidente de Trabalho, o que pode exigir que a própria empresa também tenha pessoas treinadas para fazer este registro de forma eletrônica, nesse tipo de situação”, salienta.
Além da velocidade com que as informações terão de ser fornecidas, Donin Jr. lista outras situações que requerem planejamento e sintonia fina entre contador e empresário. É o caso dos dados por procuração eletrônica ou pelo certificado do cliente, de salários, de registros de processos trabalhistas e de registros dos Programas de Controle Médico de Saúde Ocupacional e de Prevenção de Riscos Ambientais. “As assessorias contábeis têm de estar atentas e ajustar com seus clientes como serão as formas de envio e processamento dessas informações. Os empresários, por sua vez, precisam perceber que devem ser eles os maiores interessados pelo cumprimento das obrigações do eSocial, já que existe uma palavrinha mágica chamada ‘multa’. Por isso, é fundamental informar e esclarecer quais as punições a que eles ficam sujeitos se não forem cumpridas as determinações do planejamento para a entrega do eSocial”, conclui o dirigente da Fenacon.
Texto: Danielle Ruas