Registrar a origem de depósitos e de movimentações em dinheiro não é apenas exigência legal, mas uma boa prática que auxilia a empresa a gerenciar riscos e manter a conformidade de suas operações.
A movimentação financeira por parte das empresas é cada vez mais passível de verificações e cruzamentos de dados por parte de órgãos e entidades que regulam o sistema financeiro e tributário do País. Essas apurações são feitas com base nas transações registradas e informadas por instituições financeiras, mas também contam com as informações prestadas pelo próprio contribuinte, quando entrega sua declaração de Imposto de Renda ou cumpre determinada obrigação acessória.
O controle rigoroso das informações sobre transações financeiras é antes de tudo uma boa prática de gestão para o negócio, auxiliando gestores a administrarem as contas da organização.
Entretanto, está relacionado, também, às obrigações legais assumidas pela empresa e à gestão de riscos para o negócio.
A Declaração de Operações Liquidadas com Moeda em Espécie (DME) é uma dessas obrigações. Instituída pela Instrução Normativa RFB nº 1.761/17 e em vigor desde janeiro de 2018, ela deve ser preenchida e entregue sempre que uma pessoa física ou jurídica tenha recebido valores em espécie cuja soma seja igual ou superior a R$ 30 mil, ou o equivalente em outra moeda. Manter esse e outros registros é indispensável para proteger a empresa contra sanções por inadequação ou para comprovar a licitude de suas operações quando necessário.
Em 30 de abril de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a incidência do Imposto de Renda sobre depósitos bancários que não tenham origem comprovada pelo titular e desde que ele tenha sido intimado para comprovar e não o fez. Essa situação se aplica aos casos em que a Receita Federal presumir que ganhos de receita ou de faturamento foram omitidos por parte da pessoa física ou jurídica.
Compliance criminal
A advogada criminalista, sócia-fundadora da DMKT Advocacia Criminal e autora do livro Criminal compliance na perspectiva da lei de lavagem de dinheiro, Dra. Débora Motta Cardoso, sublinha que o registro financeiro é um documento importante para preservar a empresa, pois ele é peça central na linha de investigação policial para casos de crimes financeiros.
“Quanto mais registradas estiverem as movimentações feitas por uma empresa, menor a chance de ela ser envolvida em práticas de lavagem de dinheiro”, esclarece. “Ainda que um cliente ou um funcionário tenha praticado crime, o bom registro vai mostrar que a empresa não se envolveu no delito”.
Essa é uma das ferramentas mais relevantes do compliance criminal, conjunto de medidas para garantir conformidade da empresa à lei, evitando a prática de crime na organização. “A empresa tem que ter a segurança de que, caso seja chamada a esclarecer alguma coisa, tenha documento para comprovar sua licitude na operação. Se o compliance documenta passo a passo a atividade que está realizando e ficar bem demonstrado que a empresa tomou todas as cautelas normais de ser diligente, está excluída a responsabilidade”, orienta Cardoso.
Penalidades
Em relação à DME, o presidente do Sindicato dos Contabilistas de São Paulo (Sindcont-SP), Geraldo Carlos Lima, alerta para problemas que as empresas podem enfrentar caso descumpram a obrigação. As sanções, esclarece, estão previstas no artigo 9º da Instrução Normativa RFB nº 1.761/17, que fixa multa entre R$ 100 e R$ 1,5 mil, dependendo do regime jurídico ou da condição do contribuinte.
Além da multa, a Receita Federal pode acionar o Ministério Público Federal, caso haja indícios de crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, conforme previstos no artigo 1º da Lei nº 9.613/98. Por isso, Lima recomenda que as empresas sempre comuniquem à Receita Federal as operações financeiras realizadas em espécie com valor igual ou superior a R$ 30 mil “ou o equivalente em outra moeda com a mesma pessoa física ou jurídica”.
O presidente do Sindcont-SP afirma ainda que “registrar todas as operações, identificando sua origem e destino”, é um requisito básico para a empresa. “No caso de pessoa jurídica, os registros devem estar na contabilidade; já no caso de pessoa física, há a opção do livro-caixa”. Essa é a maneira mais adequada para evitar a incidência do imposto de renda sobre depósitos bancários que não tenham origem comprovada, validada pelo STF.