Novas regras do Banco Central ampliam a competitividade entre instituições financeiras para concessão de crédito lastreado em receitas a receber. Medida deve ampliar acesso aos recursos e reduzir juros.

O crédito é um dos instrumentos mais importantes para a atividade empresarial no Brasil; entretanto, as Micro e Pequenas Empresas (MPEs) enfrentam uma série de barreiras na busca por esses recursos. Uma dessas dificuldades está relacionada à apresentação de garantias, que viabiliza operações de crédito e reduz seus custos.

Na falta de patrimônio para oferecer em garantia ou diante dos altos juros praticados em linhas de crédito tradicionais, a antecipação de recebíveis acabou se tornando uma opção para os pequenos negócios, porém essas operações sofriam restrições que limitavam as possibilidades de utilização por parte das MPEs.

O assessor econômico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Fábio Pina, explica que, até há pouco tempo, o crédito por recebíveis só podia ser concedido uma única vez até a quitação do empréstimo, procedimento conhecido como “trava bancária”. Dessa forma, a empresa que antecipava 20% dos créditos que teria a receber ao longo de um ano não poderia fazer outra operação do mesmo tipo, ainda que tivesse mais recursos disponíveis para negociar, enquanto a antecipação anterior estivesse em vigência.

O que mudou

Desde o início de junho, estão em vigor novas regras do Banco Central para a antecipação de recebíveis. Por meio da Resolução nº 4.734/19 e da Circular nº 3.952/19, a instituição estabeleceu os procedimentos que passam a valer para esse tipo de operação. A principal mudança foi a criação de um sistema que unifica informações sobre créditos a receber e que é abastecido por registradoras de recebíveis.

As registradoras armazenam tanto os dados relativos às vendas com cartão (os recebíveis) quanto os contratos de antecipação firmados com instituições financeiras, gerando simetria de informações, ou seja, evitando contradições ou duplicidade de dados. Segundo o Banco Central, os registros garantem mais segurança jurídica e operacional às concessões de crédito por recebíveis.

Na avaliação do especialista em Direito Empresarial e professor do Insper, Marcelo Godke, as novas medidas demonstram esforço do Banco Central para fomentar a competição do mercado, permitindo que não apenas bancos, mas instituições de pagamento e fintechs também consigam atuar no segmento.

“Todo mercado que se torna mais competitivo apresenta melhora na qualidade e redução de custos”, observa e acrescenta: “O aumento da competição vai aumentar a eficiência, melhorar a qualidade do crédito e diminuir a taxa de juros”.

O que avaliar

A questão do custo para obtenção do crédito é sempre um critério relevante a ser considerado no momento da captação dos recursos. A expectativa é de que, com o aumento da competitividade no setor, as taxas de juros para antecipação de recebíveis sejam reduzidas; entretanto, essa percepção pode ser comprometida no cenário atual, pois, neste ano, a taxa básica de juros está sofrendo sucessivos aumentos. A melhor solução é comparar os juros praticados em diferentes linhas de crédito e entre diferentes instituições financeiras para identificar as opções mais vantajosas.

Nem sempre o empresário faz as contas e, por vezes, ignora variações que considera pequenas, mas que podem pesar bastante ao longo do tempo. Uma taxa de 4% ao mês tem impacto consideravelmente maior do que uma taxa de 2% quando se avalia o crescimento exponencial em 12 meses. “Chegamos à conclusão de que a diferença é muito mais que o dobro. Se 2% ao mês representam 25% ao ano, 4% é mais de 60% ao ano”, alerta Pina.

Godke ressalta que é importante considerar a qualidade do crédito. O empresário que antes utilizava o próprio imóvel como garantia em um empréstimo para a empresa colocava em risco o patrimônio pessoal. “Com a antecipação de recebíveis, evita-se essa situação”, alega o especialista.

A negociação com diferentes instituições financeiras dependerá do compartilhamento das informações constantes no sistema único de registro, mediante autorização da empresa. Godke e Pina salientam que o compartilhamento dos dados é uma prática que segue padrões de segurança, limitando o acesso apenas às informações essenciais.