A vacinação representa otimismo e indica que o próximo ano trará melhores oportunidades para os negócios. O planejamento empresarial, entretanto, exige cautela, análise rigorosa e flexibilidade
Perspectivas positivas para o ano de 2022 devem ser consideradas com racionalidade no planejamento empresarial. Há um entusiasmo promovido pelo avanço da vacinação e a reabertura gradativa das atividades econômicas, mas é preciso analisar criteriosamente os aspectos que sustentam as expectativas.
O professor da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), Edson Barbero, avalia que o cenário dependerá muito do setor de atuação da empresa, tendendo a favorecer, principalmente, negócios que mais dependem da circulação de pessoas, como turismo, restaurantes, bares e parte do comércio. Porém, mesmo nesses casos, empresários e gestores precisam construir a percepção sobre como o mercado vai reagir.
“A principal fonte de conhecimento é o diálogo empático com os clientes”, afirma Barbero. “Em linhas gerais, 2022 vai ser um retorno, mas o cenário ainda é de incerteza”, pondera. A articulação com todos os stakeholders (além de clientes, fornecedores, colaboradores e investidores, por exemplo) trará muitas respostas relevantes sobre aspectos como cadeia de fornecimento, gestão de equipes, necessidade de contratação, entre outros pontos, para o planejamento de 2022.
Os planos precisam contemplar o processo de evolução em relação à transformação digital do negócio. O professor observa que muitas empresas começaram a promover a digitalização recentemente e, agora, devem entender como podem usar as ferramentas digitais com mais eficiência e efetividade. Talvez, o empresário sinta a necessidade de investir mais; entretanto, Barbero recomenda que fortes investimentos sejam avaliados com cuidado, pois, além da pandemia, há efeitos econômicos e políticos que podem impactar as empresas e o mercado consumidor. Os pontos prioritários do planejamento para 2022 devem ser a preservação do caixa, a elaboração de planos de curto prazo (por exemplo, trimestrais) e a criação de uma matriz de riscos. “O que puder fazer para manter a saúde e a liquidez do caixa é relevante, pois não estamos em um período de pujança econômica”, orienta. Planejar para o curto prazo e revisar o planejamento constantemente são medidas que favorecem a flexibilidade em momentos de instabilidade como o atual.
Barbero frisa que todo negócio precisa ter uma matriz de riscos que permita identificar os eventos que podem ocorrer e impactar o negócio. É o caso, por exemplo, da pandemia e seus efeitos, do desempenho da economia e da instabilidade política. Para cada ocorrência mapeada é preciso projetar uma resposta adequada – assim, a empresa estabelece caminhos para contornar as adversidades previstas.
Do cenário pessimista ao otimista
Os consultores, professores e autores do livro Guia prático de planejamento e gestão estratégica descomplicada em ambientes turbulentos (em editoração), Heles Soares Júnior e Júlio Miranda, dizem que não percebem otimismo por parte dos empresários, mas, sim, uma forte expectativa. Eles endossam a orientação para que haja cautela em relação aos planos, mas esclarecem que isso não significa que as empresas devem se retrair ou ignorar o longo prazo.
Mesmo considerando a demanda reprimida, que pode estimular atividades como turismo, eventos e alguns ramos do comércio, é importante ter em mente que a retomada do mercado não significa, necessariamente, que as coisas voltarão a ser como eram. Os consultores lembram que a pandemia provocou mudanças de hábitos de consumo e continua acelerando transformações que impactam todos os negócios e suas cadeias produtivas.
Nesse sentido, a recomendação é monitorar a dinâmica do mercado e da concorrência, a possibilidade de criação de novos mercados, a evolução da tecnologia, as mudanças nas relações de trabalho, os movimentos econômicos e políticos, entre outros aspectos que afetam o ambiente de negócios.
Soares Jr. e Miranda ressaltam que se trata de um contexto de complexidade, que exige planejamento e gestão estratégica por parte das empresas. O planejamento deve ser feito para cenários alternativos: básico, otimista e pessimista. Para cada um desses cenários é preciso traçar diferentes linhas de ações estratégicas básicas. “É por essa razão que defendemos que planos estratégicos devem ser trilhas, nunca trilhos”, sustentam.
As lições aprendidas entre 2020 e 2021, a partir da própria realidade e das experiências de outras organizações, não devem ser esquecidas, mas, sim, incorporadas definitivamente. Os consultores entendem que este é o momento de “reforçar e consolidar as mudanças feitas pelas empresas, tais como transformação digital, redução de custos, melhorias nos processos com a eliminação de gargalos e racionalização de métodos, etc.”.
O bom desempenho dos negócios depende, ainda, do alinhamento integral entre as atividades desenvolvidas e os planos estratégicos, baseado num modelo de gestão mais dinâmico.
Novas configurações de trabalho
“Nunca planejamento, foco, dinamismo gerencial e flexibilidade foram tão relevantes como neste momento”, argumentam Soares Jr. e Miranda. “Estamos frente a frente com a Indústria 4.0, que é altamente tecnológica e de grande valorização da responsabilidade social, ambiental e de governança”.
Períodos de transição, como o atual, exigem diferentes esforços de adaptação. Um deles refere-se ao mercado de trabalho. De acordo com o estudo O futuro do trabalho, publicado em outubro de 2020 pelo Fórum Econômico Mundial, a pandemia acelerou o processo de automação, afetando inúmeras profissões.
A organização estima que 85 milhões de empregos serão impactados pela divisão de trabalho entre pessoas e máquinas até 2025, em 26 países analisados, entre os quais, o Brasil. O relatório aponta que, entre os profissionais que permanecerem em suas funções, 50% precisarão de requalificação. “Isso obrigará as empresas a exercerem papel importante na educação e formação de mão de obra”, alertam.
Por esse motivo, o alinhamento permanente com os públicos relevantes para a empresa ganhou ainda mais importância e requer a conciliação de medidas de curto, médio e longo prazos. As novas configurações de trabalho devem consolidar o sistema híbrido, dividido entre presencial e remoto. O risco está colocado para empresas e pessoas com maior dificuldade de adaptação a esse contexto.