Em meio às discussões sobre a legalidade da cobrança no ano de 2022, empresas devem decidir qual conduta adotar em relação ao recolhimento do tributo, considerando riscos e mecanismos de proteção.

O Diferencial de Alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (Difal-ICMS) é um tributo devido em operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado. Cabe ao Estado onde se localiza o destinatário, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual, conforme estabelece a Emenda Constitucional 87/15. Este entendimento foi disciplinado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) por meio do Convênio ICMS 93/15.

Assim, a partir de 2015, os Estados brasileiros passaram a publicar leis ordinárias e decretos para instituir a cobrança do Difal-ICMS sobre as vendas realizadas para o consumidor final não contribuinte do ICMS. O problema é que o artigo 146 da Constituição Federal determina que a lei complementar (LC) deve estabelecer normas gerais e disciplinar conflitos de competência, antecedendo as leis ordinárias que criam novos impostos. Logo, leis ordinárias e decretos estaduais, bem como regras definidas pelo Confaz, são inconstitucionais em razão da ausência de LC disciplinando a matéria.

O reflexo imediato foi o questionamento judicial da cobrança. Em fevereiro de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade das cláusulas do Convênio ICMS nº 93/15 e determinou a regulamentação do Difal por LC. “Em razão disso, foi editada a LC nº 190/22, publicada em 5 de janeiro, para alterar a LC nº 87/96 (Lei Kandir) e regulamentar a instituição, pelos Estados e Distrito Federal, do Difal”, esclarece a advogada, professora de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e fundadora do Treiger Grupenmacher Advogados Associados, Betina Treiger Grupenmacher.

De acordo com a LC, sua vigência se daria a partir da data de publicação, porém só poderia produzir efeitos respeitando-se o princípio constitucional da anterioridade nonagesimal (90 dias da publicação) e anual, que veda a produção de efeitos no mesmo exercício financeiro da publicação legal. No entanto, a maioria dos Estados já se posicionou no sentido de cobrar o Difal-ICMS após transcorrido o prazo da “noventena”.

“A intenção de vários Estados de exigir o imposto ainda em 2022, sem a observância do princípio constitucional da anterioridade anual, é concreta, sendo importante que as empresas se antecipem, buscando a tutela jurisdicional de modo a assegurar seu direito de não serem compelidas ao recolhimento do referido tributo”, orienta Grupenmacher.

O presidente da Associação Brasileira de Advocacia Tributária (Abat) e sócio do Henares Advogados Associados, Halley Henares Neto, alerta que a discussão atual se refere apenas ao Difal-ICMS aplicável ao consumidor final não contribuinte do ICMS e recomenda que as empresas avaliem o impacto do Difal em suas operações. “Caso os números sejam relevantes, é necessário que procurem um advogado de confiança para que possam obter orientações e ajuizar a medida judicial cabível”.

O que avaliar?

Cabe ao empresário tomar a decisão em relação a recolher ou não o tributo. Os especialistas advertem que essa escolha implica riscos e efeitos futuros, que devem ser analisados previamente.

Ao optar por não recolher o Difal-ICMS exigido pelo Estado, a empresa deve buscar uma liminar judicial para não ser penalizada. Sem respaldo judicial, há o risco de que as mercadorias em transporte sejam barradas nos Estados de destino. É possível, ainda, que a organização sofra autuação fiscal, com a cobrança do tributo mais juros e multas (mora e isolada), exemplifica Henares Neto.

Caso opte por recolher o tributo, o empresário deve estar ciente de que talvez não consiga recuperar os valores pagos. “Para solicitar a restituição, seria necessária a autorização expressa e individual de cada consumidor, procedimento inviável para as empresas”, argumenta o presidente da Abat.

Além disso, existe a possibilidade de que a questão seja julgada em Ação Direta de Inconstitucionalidade ou em Recurso Extraordinário de repercussão geral, “com modulação dos efeitos e validade apenas para o futuro, o que pode inviabilizar a recuperação dos valores pagos indevidamente se a empresa não houver questionado judicialmente a referida cobrança”, observa Grupenmacher.