Ouvir os colaboradores pode ajudar a antecipar problemas, a engajar a equipe e até tomar decisões melhores. Veja como colocar essa prática em ação de forma estratégica e consistente
Conversar abertamente com os funcionários, de forma sistemática e estratégica, tem se consolidado como uma ferramenta de gestão eficaz. Conhecido como employee voice (voz dos colaboradores, em português), esse processo permite transformar percepções da equipe em dados relevantes para orientar decisões, prevenir conflitos e melhorar o ambiente de trabalho.
Apesar do potencial, o conceito da escuta ativa, como ficou conhecida essa prática de gestão no Brasil, ainda encontra barreiras na cultura empresarial. Muitas lideranças acreditam que já escutam suas equipes, mas, na prática, não possuem um processo estruturado de feedback ou não adotam ações concretas a partir desse retorno.
“É comum que a liderança acredite já estar ouvindo, mas ouvir de verdade é diferente de apenas dar espaço. Envolve acolher, refletir e, principalmente, agir”, observa a presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos de SP (ABRH-SP) e CEO da Umanni, Eliane Aere.
É nesse ponto que muitas tentativas fracassam: quando não há retorno ou iniciativa baseada nos feedbacks. “Coletar feedback sem plano de ação gera frustração e quebra de confiança”, alerta a diretora de Recursos Humanos da Sólides, Távira Magalhães.
O medo de lidar com críticas ou sugestões difíceis também impede o avanço do processo. “Mas ignorar a escuta não elimina os problemas, só os adia”, enfatiza Aere.
Outro aspecto central está na formação das lideranças. Muitos gestores foram treinados para oferecer respostas, e não para escutar ativamente. “O primeiro desafio é a cultura do ‘saber tudo’. Superar isso exige coragem institucional e preparo para escutar com empatia, sem defesa”, afirma Aere.
Ambiente seguro
O impacto direto da escuta ativa na retenção de talentos e no engajamento das equipes mostra que a prática não é apenas sinal de boa convivência: é também uma escolha estratégica. Além disso, permite identificar gargalos operacionais com mais agilidade, reduzir retrabalhos e ajustar processos com base na realidade vivida por quem está na linha de frente das atividades.
Para apoiar esse processo, empresas têm investido em múltiplas frentes: de canais anônimos de escuta e rodas de conversa a avaliações contínuas e grupos focais, passando também pela análise cruzada de dados de desempenho, rotatividade e clima. Essas práticas permitem identificar padrões de comportamento, mapear expectativas não atendidas e detectar sinais de insatisfação antes que se tornem problemas maiores. A combinação de diferentes instrumentos amplia a compreensão do que realmente afeta o dia a dia das equipes e oferece subsídios mais precisos para ações de melhoria.
Práticas de employee voice, no entanto, só geram resultado quando inseridas em uma cultura organizacional que valoriza a escuta e promove a confiança mútua nas relações. “Ambientes seguros são construídos nos detalhes: na forma como uma ideia é recebida, na atenção que se dá a uma sugestão, no retorno que se oferece depois da escuta. A base de tudo é o respeito”, ressalta Aere.
A escuta ativa dos colaboradores não substitui outras ferramentas de gestão, mas amplia o repertório de dados disponíveis, fortalece a cultura de confiança e melhora a conexão entre liderança e equipe.
Passo a passo da escuta ativa
Távira Magalhães destaca um passo a passo de ações voltadas para a efetividade da prática:
- estabelecer uma rotina estruturada de escuta e análise de viabilidade, com periodicidade definida e devolutivas mesmo nos casos em que as sugestões não forem aplicadas;
- treinar gestores para acolher, analisar e tratar os feedbacks com responsabilidade e abertura;
- definir responsáveis e prazos para encaminhamento de cada tipo de contribuição, garantindo que o colaborador saiba o destino de suas sugestões;
- priorizar os insights com maior impacto na experiência das equipes e nos resultados do negócio, transformando-os em planos de ação concretos;
- comunicar de forma transparente as decisões tomadas, reforçando o ciclo da escuta e a cultura de participação.