Aumento da taxa Selic encarece o custo do crédito e provoca retração no consumo, efeitos que podem ser contornados com revisão de despesas, renegociação de dívidas e gestão financeira mais estratégica
A alta da taxa Selic, que em março alcançou o maior patamar desde outubro de 2016, sendo fixada em 14,25% ao ano, reflete a estratégia do Banco Central para controle da inflação. Porém, essa decisão atinge diretamente as empresas, dificultando o acesso ao crédito e reduzindo o consumo. Para as micro, pequenas e médias empresas (MPMEs), que já enfrentam dificuldades financeiras, o impacto é ainda maior.
A presidenta do Conselho Federal de Economia (Cofecon) e doutora em Economia Aplicada, Tania Teixeira, afirma ser preciso questionar essa abordagem, que impõe altos custos sociais e econômicos, e nem sempre consegue resolver os fatores estruturais que pressionam a inflação. “A política de juros altos encarece o crédito, reduz a atividade produtiva e penaliza trabalhadores e empresas. Precisamos de um debate mais amplo sobre o papel do Banco Central e a eficácia desse modelo de combate à inflação”.
“Os aumentos sucessivos da taxa Selic comprometem o orçamento público, afetando o custeio da máquina pública e os investimentos governamentais”, alerta o professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Gestão de Políticas Públicas da Universidade de Brasília (FACE/UnB), Roberto Bocaccio Piscitelli. Por sua vez, a dificuldade do governo fazer novos investimentos eleva o custo do capital.
Para as empresas, o principal reflexo dessa elevação da Selic é justamente o aumento do custo do crédito. Com juros mais altos, o financiamento se torna mais oneroso, o que compromete a capacidade de expansão e modernização, especialmente para MPMEs. Além disso, a alta dos juros tende a reduzir o consumo e a demanda por produtos e serviços, resultando em uma desaceleração nos negócios.
“O aumento da Selic impacta todas as empresas, pois elas dependem de capitais de terceiros, especialmente em fases de expansão, para financiar o capital de giro e os investimentos. Contudo, as pequenas empresas são mais vulneráveis a essas oscilações, já que enfrentam maior dificuldade para acessar crédito e sofrem mais com as variações na atividade econômica”, destaca Piscitelli.
Alternativas para superar desafios
Mesmo num cenário econômico adverso, há alternativas para atenuar o efeito dos juros elevados. Para empresas com reservas financeiras, Teixeira sugere a adoção de estratégias que potencializem os rendimentos, como o investimento em produtos de renda fixa atrelados à Selic – a exemplo de títulos públicos, fundos e outros instrumentos vinculados ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI), que acompanha de perto a taxa básica de juros.
No entanto, essa opção é mais viável para grandes empresas, que dispõem de recursos e acesso a produtos financeiros diferenciados. Para as MPMEs, o desafio é maior, pois existe dependência de liquidez para sustentar o capital de giro. Nesse caso, a orientação é reavaliar dívidas com fornecedores e credores. “Uma renegociação bem estruturada pode aliviar a pressão financeira no curto prazo”, aponta.
Além disso, revisar despesas operacionais e eliminar custos desnecessários são ações que podem melhorar a eficiência da gestão financeira e preservar recursos essenciais, segundo Teixeira.
Piscitelli recomenda que as empresas adotem uma abordagem mais criteriosa na busca por crédito, avaliando com atenção as fontes de financiamento e buscando condições mais vantajosas, compatíveis com seus custos operacionais.
Cenário futuro
Diante do atual cenário econômico, a adaptação das empresas será decisiva para garantir sustentabilidade e crescimento dos negócios. Além de medidas imediatas, é preciso investir em planejamento estratégico de longo prazo, com foco em inovação, diversificação de receitas e gestão financeira rigorosa. A busca por fontes de financiamento mais acessíveis e a reavaliação das prioridades de investimento também serão essenciais.
Entretanto, como ressalta Teixeira, é fundamental que o governo também atue para criar um ambiente macroeconômico mais favorável. “Sem uma política de crédito acessível e um planejamento estratégico de médio e longo prazo, mesmo a melhor gestão interna será insuficiente para garantir a sustentabilidade de muitas empresas”.